29 de jul. de 2017

Espaços de comportamento

Bad Day por Henn Kim

Quando estou em depressão a vontade de fazer coisas que gosto e realizar pequenas tarefas do cotidiano se esvai e deixa lugar para um enorme buraco a ser preenchido com ideias de inutilidade, culpa e flagelo. Coisas importantes como comer, tomar banho, levantar da cama passam a demandar quase toda a energia que tenho disponível. 
Como eu gostaria que fosse.
Isso, somado ao meu maravilhoso sofá preto, que em épocas de inverno ganhou um maravilhoso edredom preto, que combina perfeitamente com as persianas pretas que transformam a sala em uma completa caverna durante o dia, são um convite.
porco dormindo no sofá com computador ligado
Como se parece na verdade.
(imagem meramente ilustrativa)


Eu quando muito, saio da cama, por vergonha de ficar na cama e me instalo no sofá. Me acompanham o computador, tablet, livro, controle da tv, uma guloseima e almofadas. Banquinhos e aparadores logo começam a ser incorporados a instalação e compor um cenário rodeado de copos, xícaras, restos de comida em pratos e louças. Eu estou pronta para hibernar por dias nesse antro. Sem banho, sem comida, sem energia pra me mover, no máximo virar para um lado e para o outro e lamentar ainda estar viva. 
 Então me pergunto se o problema é o sofá, se eu deveria me proibir de sentar no sofá por este ser o grande gatilho pra chegar no fim do dia me culpando por não ter feito o que devia. Não é o sofá, percebi que consigo os mesmos resultados na cama, na cadeira do escritório, no tapete da sala... Nunca tentei no banheiro, mas posso garantir que não seria difícil, só um pouco mais gelado. 
Já tentei ir à padaria, ao parque, à biblioteca, um café, docerias, espaço coworking. A instalação improdutiva é a mesma. Cheguei a raiz do problema, eu e não os espaços.
Existem espaços que estimulam a criatividade e o trabalho, mas existem posturas que não se importam com os espaços. Sabe aquela pessoa que pode trabalhar em um saguão de aeroporto e render bem aquelas malditas duas horas de espera da conexão? Eu já fui assim. Lia no ônibus, escrevia sentada em qualquer lugar. Não parava um segundo, fazendo duas coisas ao mesmo tempo às vezes completamente incompatíveis com o ambiente.
Agora a vida se resume em ver o tempo passar e dar um saltos estranhos. Tenho mais acesso à internet, é verdade que esse tipo de conexão rouba preciosos minutos do dia e nos atrai para um mundo de variedades, prazeres imediatos e ansiedade pelas respostas. Minha concentração diminuiu, meu poder imersivo aumentou e acho que imergir em si mesmo é um dos fatores que leva à depressão. Eu vivia constantemente preocupada com os outros e isso me relegava ao segundo plano, tinha tantas atividades para os outros que abdicava meu tempo livre, de atividades para mim. Ao realizar o movimento inverso, de encontrar prazer nas atividades que são minhas, como ler, ver tv, pensar na minha vida, comecei a me desconectar e me isolar, criando uma bolha de sobrevivência, que geralmente inclui um edredom.
Quebrar essas práticas tem mais a ver com atitude do que com espaço. 
  • Encontrar um equilíbrio entre o que eu fazia pelos outros e o que eu faço por mim;
  • Identificar a recompensa imediata;
  • Reencontrar os motivos para o esforço em fazer o que não dá prazer, mas é necessário (isso inclui coisas como fazer comida ultimamente);
  • Encontrar o necessário, aquilo que feito vai resultar em ganhos;
Eu estou nessa fase, tentando retomar minha vida. Com dias de mais e outros de menos sucesso. Tentando não me culpar por isso, nem inventar desculpas. Só aceitar que existem momentos melhores e piores que dependem de fatores aos quais eu não tenho controle.